Falso 9: o elemento das superioridades

4 min readJul 25, 2021
Pep Guardiola e o seu falso 9 predileto: Lionel Messi

Sexta-feira, 1 de maio de 2009, véspera de “El Clássico” no Santiago Bernabéu entre Real Madrid CF e FC Barcelona: Pep Guardiola chama Lionel Messi à Ciutat Esportiva Joan Gamper para lhe explicar a posição em que o mesmo iria ser utilizado no grande jogo do dia seguinte. Algo que viria para revolucionar o futebol estava prestes a chegar e Guardiola precisava de Messi, o seu melhor jogador, para cumprir escrupulosamente aquilo que a função de falso 9 pedia e concedia ao jogo da mítica equipa dos culés.

Como Lionel Messi e Xavi Hernández explicam no vídeo seguinte, a utilização do falso 9 foi uma surpresa para o adversário. E mesmo hoje em dia, ainda o é, sobretudo devido à dificuldade que existe para defender um elemento que cria superioridades com facilidade sobre o meio campo e que é dotado de imensa mobilidade, podendo ocupar qualquer espaço vazio que surja.

Edição de um vídeo retirado da página do Facebook “Craques”, aonde aparecem excertos do filme “Take The Ball, Pass The Ball”

Depois de ter atingido o auge com Pep Guardiola no FC Barcelona, a função de falso 9 foi caindo em desuso, tendo sido várias vezes interpretada de forma errónea, sobretudo naquilo que diz respeito ao que é o trabalho em torno da mesma: utilização dos jogadores no contexto certo, ruturas, ocupação racional de espaços, atrações, contramovimentos, ativação de terceiros homens, fugas à marcação individual, entre outros aspetos que estão relacionados com o jogo. Ultimamente, o Liverpool FC de Jürgen Klopp tem sido a equipa que melhor uso tem dado à função de falso 9, o qual é interpretado de forma exemplar pelo brasileiro Roberto Firmino, sendo que este impressiona na ocupação de espaços e na fuga aos centrais adversários.

Luis Enrique com o falso 9 da “La Roja”

Luis Enrique foi o técnico que, mais recentemente, usou o falso 9 com bastante sucesso em termos táticos. Durante a campanha espanhola no Campeonato da Europa de 2020, o técnico com passado blaugrana vinha utilizando Álvaro Morata como avançado centro, sendo que o mesmo procurava fixar os centrais adversários e atacar a profundidade para abrir espaço nas costas dos médios adversários. Porém, frente a Itália, tudo mudou. Como tinha observado que Bonucci e Chiellini tinham problemas em lidar com avançados que fugissem para longe da sua marcação, o treinador espanhol colocou Dani Olmo como falso 9, quer para diminuir o impacto defensivo dos centrais, quer para ganhar superioridade e confundir as referências individuais dos médios italianos. E foi isso que aconteceu, como mostra o vídeo seguinte.

Ações de superioridade tática de Espanha sobre Itália devido à utilização do falso 9

A utilização de um falso 9 oferece a uma equipa bastantes benefícios, como são exemplo os seguintes: superioridade sobre o setor intermédio da equipa adversária (4x3 ou 4x2); retirada de referências individuais aos centrais adversários — como que se não estivessem a defender ninguém; atração no corredor central para depois lançar diagonais fora-dentro dos extremos; se querem defender de forma individual, os centrais adversários têm de percorrer muitos metros, chegando muitas vezes atrasados, o que gera bastante desorganização na linha defensiva; o falso 9 é, na maioria das vezes, o homem livre; facilidade em ativar o princípio do terceiro homem através do falso 9; entre outras.

Por fim, para complementar o artigo, a visão de uma pessoal ligada ao futebol sobre o falso 9:

“O falso 9 é uma gambeta tática. Na descrição, e na dinâmica em campo, há um tentativa de prometer algo ao adversário para, depois de ele se comprometer, procurar a direção oposta. Os falsos 9 prometem uma referência confortável aos centrais para, no momento certo, abandonarem a última linha e virem procurar ligações com os companheiros em zonas muito mais baixas do terreno. Desta forma, provocam crises de decisão aos centrais: seguem-nos ou não? E, se seguem, existe um grande desconforto por saírem para zonas que não sabem como interpretar. Se o trabalho fica para os médios então aparecem as superioridades numéricas para quem vê tudo de frente e não é pressionado e daí os problemas surgem em catadupa para quem defende. Tudo no falso 9 é para “desadaptar”, mas ao contrário de outras soluções táticas, é das menos óbvias de interpretar e contrariar, e talvez por isso a sua eficácia seja diretamente proporcional àqualidade que requer dos seus executantes.” — Filipe Silva, Treinador de Futebol UEFA C e Analista no CF Perosinho

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Written by Raumdeuter

“O futebol é um jogo que se joga com o cérebro. Tens de estar no lugar certo, no momento certo. Nem antes, nem depois.”

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